Entrevista especial com Patrícia Souza Oliveira Ramos, Assistente Social do INSS em Goiás, membro titular do Comitê Nacional de Acessibilidade do INSS.
No 21 de setembro celebra-se o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência. Marco histórico para as reivindicações dessa parcela da população, a data foi escolhida por movimento sociais em 1982 e instituída oficialmente pela lei nº 11.133, de 14 de julho de 2005, informa a Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB).
Neste período de quase 40 anos houve muitas mudanças, afirma o presidente da entidade, Beto Pereira. Entre as conquistas estão a Lei 8.213/91 (Lei de Cotas de trabalho para pessoas com deficiência), a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas, ratificada no Brasil em 2008, pelo Congresso Nacional, e a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), sancionada em 2015.
A ONCB aponta que, no entanto, a Lei de Cotas tem sofrido ataques, como as tentativas recentes de mudá-la por meio de projetos de lei e uma proposta de medida provisória. Outro retrocesso é o enfraquecimento de instâncias de participação social, com o engessamento das atividades de conselhos nas esferas federal, estadual e municipal.
A ONG avalia que a pandemia do novo coronavírus é um dos principais desafios no momento: “as pessoas com deficiência estão em maior vulnerabilidade social e é papel do Estado atuar em conjunto com a sociedade civil para elaborar políticas públicas eficientes para atender essa parcela da população”, ressalta.
A entidade sem fins lucrativos elenca como principais desafios uma educação verdadeiramente inclusiva, o respeito ao trabalho das organizações não governamentais, o desenvolvimento de tecnologias, sites e aplicativos mais acessíveis, a ampliação do acesso ao trabalho, renda e benefícios, saúde e cultura, e o aprimoramento do diálogo entre distintos movimentos de pessoas com deficiência.
Para destacar outras importantes conquistas e desafios dos mais de 45 milhões de brasileiros e brasileiras que possuem algum tipo de deficiência (dado do IBGE), na passagem de mais um Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência, entrevistamos a Assistente Social do INSS em Goiás, Patrícia Souza Oliveira Ramos. Servidora de carreira aprovada na vaga reservada a pessoa com deficiência, ela é membro titular do Comitê Nacional de Acessibilidade do INSS. Patrícia é profissional assistente social registrada no CRESS Goiás e filiada ao Sindicato dos Trabalhadores Federais em Saúde e Previdência Social nos Estados de Goiás e Tocantins (Sintfesp-Go/To).
ENTREVISTA/PATRÍCIA SOUZA OLIVEIRA RAMOS
Assistente Social, membra titular do Comitê Nacional de Acessibilidade do INSS
Pergunta – Na sua avaliação, quais são as principais conquistas da Pessoas Com Deficiência no Brasil?
Patrícia Ramos – Trazer para dentro da Constituição Federal o direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o reconhecimento de nossos direitos como Políticas Públicas, saindo do assistencialismo para uma concepção garantidora de dignidade humana e segurança inafiançável de vida. Isso se reforça em 2008, quando conseguimos que o Brasil se tornasse signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, que naquele ano firmou um pacto entre 192 países que estavam na ONU.
Pergunta – Na sua avaliação, quais são atualmente os principais desafios das Pessoas Com Deficiência em nosso País?
Patrícia Ramos – Um deles é fazer com que o Poder Públicos (municípios, estados e União) entenda que o BPC não é um benefício assistencialista, mas um direito que garante o acesso à vida. Atualmente, as instâncias de poder têm estabelecido regras restritivas que fogem do propósito que originou o BPC.
Pergunta – Que restrições são essas?
Patrícia Ramos – A partir de 2016 o governo federal tem imposto regras restritivas, como o Decreto 8805/2016, que altera o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, colocando ‘nas costas’ das Pessoas Com Deficiência a responsabilidade com o CADÚNICO (Cadastro Único, um conjunto de informações sobre as famílias brasileiras em situação de pobreza e extrema pobreza). Outras restrições estão na Portaria Conjunta nº 7, de 14 de setembro deste ano. A portaria, do Ministério de Estado da Cidadania e da Secretário Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, regulamenta regras e procedimentos de requerimento, concessão, manutenção e revisão do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social (BPC). Na prática, mantém represados requerimentos de BPC de 2017 e 2018, que ainda não foram analisados. Ou seja, o INSS privilegia benefícios previdenciários em detrimento dos assistenciais. O que nós defendemos é que tanto os previdenciários (também represados) quanto os assistenciais sejam concedidos automaticamente.
Pergunta – A senhora pode exemplificar uma situação hipotética de restrição do direito ao BPC?
Patrícia Ramos – É preciso antes ressaltar que essas regras restritivas tem sido impostas pelo governo sob alegação de ajuste fiscal. O que é no mínimo desumano: tirar de quem não tem e comprova vulnerabilidade infinita! Um exemplo: alguém que solicite o BPC e no cálculo da renda tenha um centavo a mais do valor de referência tem cerceado esse direito. Antes, por meio de um parecer técnico e social se considerava aspectos relevantes que superariam o mero cálculo aritmético. Agora, não! Passou um centavo, o direito é indeferido!!! Ora, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência deixa claro que não se pode mensurar apenas a renda, deve-se considerar fatores sociais.
Pergunta – A questão de se avançar no cumprimento da legislação que determina que a avaliação deve ser biopsicossocial também é outro desafio?
Patrícia Ramos – Sim e extremamente importante. A partir de 2018 a Lei Brasileira de Inclusão determina que a Pessoa Com Deficiência, para ter acesso a programas e benefícios sociais, deve ser avaliada biopsicossocialmente, por equipe multiprofissional e multidisciplinar e não apenas e tão somente por uma visão biomédica.
Pergunta – Como ou quando será possível a Pessoa Com Deficiência conquistar a plena cidadania?
Patrícia Ramos – É um processo de luta permanente. É importante o nosso protagonismo e empoderamento. Nos organizarmos e fortalecermos por meio de sindicatos e associações. Claro, essas organizações também precisam criar formas atrativas para a nossa participação, como comissões de Pessoas Com Deficiência em suas instâncias consultivas e deliberativas.
CRESS Goiás
Assessoria de Comunicação
Cláudio Marques – DRT 1534